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COVID-19 | 6 perguntas e respostas de Direito do Trabalho

Equipa de Direito do Trabalho da Abreu Advogados

1) Que medidas devem ser adotadas pelo empregador?

Nos termos do Código do Trabalho (artigo 127.º), o empregador tem o dever de zelar pela proteção da segurança e saúde dos seus trabalhadores. Nessa medida, deve o empregador adotar as medidas necessárias para garantir o cumprimento das regras referentes à segurança e saúde no trabalho, previstas, nomeadamente na Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro (Regime Jurídico da Segurança e Saúde no Trabalho).

Em concreto, no que respeita à proteção da segurança e saúde no caso do COVID-19, a Direção Geral da Saúde publicou, a 26.02.2020, a Orientação 006/2020, dirigida às Empresas, em que prevê um conjunto de procedimentos a adotar em situações de possível contágio de COVID-19.

As Empresas devem estabelecer um Plano de Contingência, em que se preveja os procedimentos a adotar perante um trabalhador com sintomas de infestação.

Essencialmente, o Plano de Contingência deve envolver os serviços de saúde e segurança no trabalho, a empresa, os trabalhadores e seus representantes, devendo conter:

  • Avaliação de risco sobre o impacto que a proliferação do vírus pode ter na estrutura produtiva da empresa;

  • Área de isolamento e os circuitos até à mesma;

  • Estrutura de responsabilidades sobre deveres de informação e comunicação relacionadas com a presença do vírus no local de trabalho;

  • Disponibilização dos contactos relevantes;

  • Disponibilização os equipamentos e produtos úteis (máscaras, toalhetes, soluções antisséticas).


2) Pode o empregador dar instruções a um trabalhador para trabalhar a partir de casa?

O nível de risco de contágio está em constante atualização. Assumem especiais responsabilidades por essa atualização a Direção Geral de Saúde (no plano nacional), o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (no plano europeu), e a Organização Mundial de Saúde (no plano mundial).

Neste contexto, o empregador tem um papel coadjuvante face ao das entidades supracitadas. Quer isto dizer que está obrigado a implementar as recomendações e procedimentos que estas lhe fazem chegar.

Assim, e por forma a garantir a saúde e segurança de todos os trabalhadores, pode o empregador dar instruções a um trabalhador para prestar atividade fora do local de trabalho, nomeadamente através do teletrabalho. Isto poderá acontecer, sempre que as funções assim o permitam e o empregador tenha um motivo atendível para temer o contágio dos restantes trabalhadores.



3) Enquanto o trabalhador estiver em isolamento mantém o seu direito à retribuição?

Isolamento com possibilidade de recursos alternativos de prestação de trabalho


Nos casos em que se pode recorrer a alternativas de prestação de trabalho, nomeadamente através do teletrabalho, é devida retribuição ao trabalhador, suportado pelo empregador, nos termos gerais.


Isolamento sem possibilidade de recursos alternativos de prestação de trabalho


No que respeita aos casos em que não é possível recorrer a meios alternativos de prestação de trabalho, o Governo proferiu o Despacho 2875-A/2020, de 3 de março, aplicável aos trabalhadores beneficiários do regime geral de segurança social, de acordo com o qual o impedimento de exercício de atividade, reconhecido por autoridade de saúde, é equiparado a internamento hospitalar, para efeitos de atribuição de subsídio de doença. A atribuição de subsídio não está sujeita a prazos de garantia, índice de profissionalidade ou período de espera.


O montante diário do subsídio é calculado pela aplicação de uma taxa à remuneração de referência, considerando o tempo de incapacidade. As taxas previstas são:

  1. 100% nos primeiros 14 dias de incapacidade;

  2. 55% nos casos em que a duração da incapacidade seja superior a 14 e até 30 dias;

  3. 60% nos casos em que a duração incapacidade seja superior a 30 dias e até 90 dias;

  4. 70% nos casos em que a duração da incapacidade seja superior a 90 dias e até 365 dias;

  5. 75% nos casos em que a duração da incapacidade seja superior a 365 dias.


4) Os trabalhadores que prestam assistência a familiar em isolamento perdem retribuição?

No que respeita às faltas de trabalhadores por assistência a familiar infetado ou em isolamento, o Despacho n.º 2875-A/2020, de 2 de março apenas faz remissão para a aplicação das regras gerais.

Nos termos gerais, as faltas dadas pelos trabalhadores são consideradas como justificadas, mas implicam a perda de remuneração por parte da Empresa, sendo pagas, em determinados casos, pela segurança social.

Note-se que, nos termos gerais, este subsídio apenas pode ser requerido para assistência a filho ou neto. Este subsídio pressupõe que, no caso de assistência a filho, apenas um dos progenitores o requeira ou, no caso de assistência a netos, que apenas os avós requeiram.

Nestes casos, pode o Trabalhar requerer, junto da segurança social, o subsídio para assistência a filho neto ou de terceira pessoa, consoante o caso concreto, nos termos gerais, sendo necessário apresentar, nomeadamente “certificação médica ou declaração hospitalar comprovativa da doença”.

Assim, não restam dúvidas de que um trabalhador com filho ou neto declaradamente infetado pode lançar mão deste tipo de subsídio, por estar em causa indiscutivelmente doença, tal como se exige a atribuição do subsídio.

A dúvida será em relação aos trabalhadores com filho ou neto com necessidade de assistência que estejam em isolamento, por suspeita de contágio.

A esse respeito, e em consonância com o estabelecido no Despacho acima referido, consideramos que poderá o trabalhador pode requerer, junto da segurança social, o respetivo subsídio, desde que esse isolamento seja reconhecido por autoridade de saúde.

Tendemos a seguir este entendimento uma vez que, nos termos desse mesmo Despacho, o impedimento temporário de trabalhadores reconhecido por autoridades de saúde, no contexto de contágio, é equiparado a doença com internamento hospitalar. Ora, tendo o trabalhador um familiar com esse mesmo reconhecimento, cremos que nada impede que o junte ao de pedido de subsídio por assistência à família.



5) Que proibições ou restrições podem ser impostas pelo empregador ao trabalhador?

No âmbito dos seus poderes de direção e disciplina, pode o empregador dar instruções e sancionar o trabalhador que não cumpra os procedimentos fixados no Plano de Contingência.

Com enorme importância, coloca-se a questão, em concreto, de saber se pode o empregador restringir (ou no Plano de Contingência, ou por uma outra via) viagens de cariz pessoal do trabalhador, e, por seu turno, se pode exigir que o trabalhador realize uma determinada viagem com fins profissionais.

Sobre este ponto importa referir que a OMS atualmente entende que a ideia de risco geográfico localizado ou regionalizado está a tornar-se obsoleta. O risco de contágio é atualmente global (Very High), estando ao mesmo nível que a China (também considerado Very High). Pelo que, o risco deve ser aferido pelos comportamentos das populações e não pela região em causa.

Analisando as potenciais restrições às viagens de cariz pessoal, nada impede que o empregador recomende a não realização de determinada viagem. Ainda assim, não pode o trabalhador ser sancionado por decidir realizar a referida viagem. As restrições fixadas pelo empregador não devem ser desajustadas com as orientações da DGS (e, consequentemente, com as da Organização Mundial de Saúde). Isto é, o empregador não deve restringir de forma desproporcional os direitos da personalidade do trabalhador, mormente a reserva da intimidade da vida privada ou a sua integridade moral. Ainda assim, e por se tratar de um comportamento de potencial contágio, o empregador pode dar instruções ao trabalhador para ficar em isolamento, sem perda da retribuição, conforme já acima exposto.

No que respeita a viagens profissionais, cabe ao empregador a decisão de mantê-las ou suspendê-las. Neste caso, coloca-se a questão de saber se, caso a Empresa decida enviar o trabalhador para um determinado país, se o mesmo pode ou não recusar essa ordem. Ora, como já referido, a OMS considera que não existem países de especial risco de contágio, havendo, por outro lado, um elevado risco de contágio a nível mundial. Portanto, em causa não estaria o destino em si, mas os comportamentos que uma viagem implica (como o contacto próximo com diversas pessoas no aeroporto, avião, etc). Neste sentido, o trabalhador pode recusar a fazer determinada viagem, independentemente do destino, por considerar que se trata de uma possibilidade de exposição ao contágio que foge à esfera de proteção do próprio trabalhador e que o empregador não consegue evitar.



6) Deve o trabalhador informar que teve um comportamento de risco?

De acordo com o artigo 17.º da Lei n.º 102/2019 (RJPSST), sobre segurança e saúde no trabalho, o trabalhador está obrigado a cumprir com as prescrições de segurança e de saúde no trabalho. Segundo este preceito, deve ainda assumir esta responsabilidade perante os demais trabalhadores.

Só através da divulgação da adoção de comportamentos de risco, por parte do trabalhador, pode o empregador assegurar aos seus trabalhadores condições de segurança e saúde, de forma continuada e permanente, tendo em consideração o princípio geral da prevenção previsto no artigo 15.º do RJPSST.

Nos termos do artigo 106.º do Código do Trabalho, ao informar o empregador, o trabalhador cumpre com o dever geral de informar sobre todas as questões relevantes.

Não queremos com isto dizer que o trabalhador está obrigado a divulgar aspetos da esfera da sua vida pessoal. Trata-se, tão-somente, de uma obrigação de comunicação de sintomas compatíveis com a definição de caso possível de COVID – 19 para que possam ser tomadas as medidas necessárias, concretamente de prevenção em relação aos seus colegas de trabalho.

Em relação à adoção de comportamentos que possam potenciar o contágio, a Direção Geral de Saúde ainda não se pronunciou sobre o tema, não esclarecendo se existe em algum momento obrigações decorrentes de comportamentos tidos por parte dos trabalhadores. Em causa confrontam-se, por um lado direito do trabalhador à reserva da intimidade da vida privada, por outro, o dever do empregador zelar pela proteção da segurança e saúde dos seus trabalhadores.

Assim, enquanto nada for recomendado pela DGS ou OMS, deve o trabalhador informar o empregador de que adotou algum dos comportamentos que contrariem os procedimentos previstos no Plano de Contingência.




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