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Comentário ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 264/2015, de 12 de Maio (in DR I Série, n.º 110, de 8 de Junho de 2015) – Violação do princípio da proibição da indefesa

Tânia Ferreira Pires, Mestre em Direito, Advogada, Abreu Advogados

O Acórdão do Tribunal Constitucional de 12 de Maio de 2015 declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 857.º, n.º 1, do Código Processo Civil (CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, quando interpretada no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória.

A declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, surge no seguimento da prolação do Acórdão n.º 714/2014, de 28 de Outubro de 2014, Acórdão n.º 828/2014, de 3 de Dezembro de 2014, Acórdão n.º 112/2015, de 11 de Fevereiro de 2015, bem como das Decisões Sumárias n.os 804/2014 e 59/2015, que julgaram esta dimensão normativa materialmente inconstitucional, no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade.
Os Acórdãos n.os 714/2014 e 828/2014, e ainda a Decisão Sumária n.º 59/2012, julgaram inconstitucional a norma contida no artigo 857.º, n.º 1, do CPC, quando interpretada “no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória, por violação do princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição”.
Por sua vez, a Decisão Sumária n.º 804/2014 pronunciou-se pela inconstitucionalidade das normas constantes do artigo 857.º, n.º 1, do CPC, também por violação do princípio da proibição da indefesa.
Assim, apesar de recorrerem a fórmulas decisórias distintas, quer as Decisões Sumárias n.º 804/2014 e n.º 59/2015, quer o Acórdão n.º 828/2014 remetem para a orientação adoptada pelo Acórdão n.º 714/2014, dando por reproduzidos os fundamentos com base nos quais este formulou o juízo de inconstitucionalidade do artigo 857.º, n.º 1, do CPC.
Nesse aludido Acórdão, “o Tribunal, entendeu que, tal como havia sido considerado no Acórdão n.º 437/2012, a equiparação entre sentença judicial e o requerimento de injunção a que foi oposta fórmula executória, enquanto títulos executivos, para efeitos de determinação dos possíveis fundamentos de oposição à execução, traduzia uma violação do princípio da proibição da indefesa, em virtude de restringir desproporcionadamente o direito de defesa do devedor em face do interesse do credor de obrigação pecuniária em obter um título executivo de forma célere e simplificada”. Assim, apesar de ter reconhecido as alterações introduzidas no artigo 857.º do CPC pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, concluiu que a “persistência em qualquer caso da regra de equiparação do requerimento de injunção objecto da aposição de fórmula executória ao título executivo judicial, com os efeitos preclusivos que a mesma acarreta ao nível dos meios de defesa ao alcance do executado, fazia permanecer inalterados os aspectos relativos ao regime específico da injunção com fundamento nos quais o Tribunal concluíra, no passado, pela inconstitucionalidade de solução legal semelhante”.
De acordo com a posição sufragada, “o alargamento dos meios de defesa à falta de pressupostos processuais, à existência de excepções de conhecimento oficioso e a factos extintivos ou modificativos da obrigação exequenda, desde que supervenientes ao prazo para oposição não teve o efeito de sanar as diferenças incontornáveis entre a execução baseada em injunção e a execução baseada em sentença, isto é, as diferenças que se fazem sentir no modo como, um e noutro caso, ao devedor é dado conhecimento das pretensões do credor e, de outra banda, na probabilidade e grau de intervenção judicial no processo”.
Em suma, o juízo de inconstitucionalidade formulado no Acórdão n.º 714/2014 foi reiterado no Acórdão n.º 824/2014, assim como nas Decisões Sumárias n.os 804/2014 e 59/2015, todos reproduzindo os fundamentos do primeiro, o que, inevitavelmente, acaba também por acontecer no Acórdão em análise que declara a inconstitucionalidade da norma com força obrigatória geral.

Cremos que a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do artigo 857.º, n.º 1, do Código Processo Civil, poderá tornar o procedimento de injunção cada vez menos “atractivo” para os credores, dado que, ao permitir-se que os executados possam deduzir oposição à execução com base em tão amplos fundamentos (todos os que são admissíveis em processo declarativo), estamos a trazer, novamente, para os Tribunais as acções que o próprio Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, quis expressamente afastar com a “desjudicialização” deste tipo de litígios. Acresce que, inevitavelmente, estes processos executivos, cujo título seja uma injunção à qual foi aposta a fórmula executória, tornar-se-ão mais morosos e implicarão um aumento de custos para as partes.

Entendemos que esta declaração de inconstitucionalidade concede uma segunda oportunidade de defesa que afronta o princípio da preclusão, consagrado no artigo 20.º, n.º 5 da Constituição – certos actos só podem ser praticados até determinada fase do processo ou dentro de um determinado prazo –, que se afiguraria apenas justificada nos casos em que por algum motivo o devedor não tomasse conhecimento do procedimento de injunção.

Disponível na BDJUR

  • Acórdão do Tribunal Constitucional nº 264/2015 de 08-06-2015
    Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 857.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, quando interpretada «no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória».