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Lei n.º 143/2015, de 8 de Setembro – Altera o Código Civil e o Código de Registo Civil e aprova o Regime Jurídico do Processo de Adoção

Ana Raquel Ribeiro, Pós-Graduada em Direito Processual Civil, Advogada, Abreu Advogados

1. O Conselho de Ministros aprovou, no passado dia 22 de Julho de 2015, a Proposta de Lei 340/XII, que procede à alteração do Código Civil na parte atinente à regulamentação da figura jurídica da adopção (assim como o Código de Processo Civil) e aprova o Regime Jurídico do Processo de Adopção (doravante apenas referido como “RJPA”).
O diploma objecto de análise entrará em vigor 90 dias após a sua publicação, ou seja, a 7 de Dezembro de 2015, mas não será aplicável aos processos judiciais pendentes à data da sua entrada em vigor, com excepção da parte em que institui a imperatividade da não notificação da sentença de adopção aos pais biológicos1e salvaguarda a obrigatoriedade de comunicação da extinção do vínculo da filiação biológica aos pais biológicos nos termos previstos no n.º 3 do art. 56.º do RJPA.

2. De entre os objectivos almejados pelo Governo com a presente reforma do sistema da adopção destacam-se a incorporação de todo o acervo normativo relativo ao tema da adopção num único diploma, com excepção das normas substantivas previstas no Código Civil, e a celeridade que se pretende impor ao processo de adopção, facilitando-se, desta forma, a compreensão do regime da adopção por parte da generalidade do cidadãos e acabando-se (pelo menos assim se espera) com o “desespero" dos candidatos a adoptantes, através da previsão expressa de um período máximo para a instrução do processo (i.e., fase preparatória) que não ultrapasse, preferencialmente, os 12 meses.

Nesta senda, foram consagrados os seguintes prazos máximos:

  1. Após comunicação da prestação do consentimento prévio para a adopção pelo tribunal ao organismo da segurança social, este procederá, no prazo máximo de 30 dias, ao estudo de caracterização da criança;

  2. Propondo, em seguida e no prazo máximo de 30 dias2, ao Conselho Nacional para a Adopção, agora criado, proposta de encaminhamento com vista a uma confiança administrativa;

  3. O Conselho Nacional para a Adopção, por sua vez, proferirá decisão sobre as propostas de encaminhamento apresentadas pelas equipas de adopção no prazo máximo de 15 dias a contar da data da respectiva apresentação;

  4. Decorridos 3 meses sobre a decisão de adoptabilidade, a equipa de adopção comunica oficiosa e fundamentadamente ao tribunal o resultado dos estudos realizados e das diligências já efectuadas com vista à concretização do projecto de adopção;

  5. Após a formalização da candidatura por parte do candidato a adoptante, o organismo de segurança social ou a instituição particular autorizada3 dará início aos procedimentos de preparação, avaliação e selecção, que deverão estar concluídos no prazo máximo de 6 meses.


À fase preparatória seguir-se-á uma [nova] fase de ajustamento, cujo período de transição não deverá ultrapassar os 15 dias e o período de pré-adopção os 6 meses4. Decorridos estes 6 meses ou logo que verificadas as condições para ser requerida a adopção, o organismo de segurança social ou a instituição particular autorizada procederá, no prazo de 30 dias, à elaboração do correspondente relatório e parecer relativo à concretização do projecto adoptivo.
Após notificação do relatório de acompanhamento e avaliação do período de pré-adopção ou decorrido o prazo de 30 dias sem que o mesmo tenha sido elaborado pelo organismo de segurança social, deverá o adoptante requerer a adopção, dentro de um prazo de 3 meses, junto do tribunal competente que, na presença do Ministério Público, ouvirá obrigatoriamente as pessoas melhor identificadas nas als. a) a c) do n.º 1 do art. 54.º do RJPA, proferindo sentença5 depois de realizadas as diligências requeridas e/ou julgadas convenientes.

Transitada em julgado a sentença constitutiva do vínculo de adopção, consagrou-se, ainda, um (novo) período de acompanhamento pós-adopção, com vista a fazer face aos particulares e, muitas vezes, inesperados desafios da adopção. A disponibilização deste acompanhamento depende, porém, de consentimento e solicitação expressos da família adoptiva6.

A propósito da celeridade que se pretende incutir ao processo de adopção, merece igualmente destaque a obrigatoriedade de, decorridos 3 meses sobre a decisão de adoptabilidade, a equipa de adopção dever comunicar oficiosamente e fundamentadamente ao tribunal o resultado das diligências já efectuadas para promover o efectivo encaminhamento da criança para o candidato seleccionado, informação que deverá actualizar trimestralmente e, bem assim, quando ocorram novos factos relevantes7. Possibilitando-se, assim, a qualquer candidato a adoptante manter-se a par do exacto ponto de situação do processo de adopção.

3. Além das alterações introduzidas a nível procedimental stricto sensu, outro aspecto a assinalar diz respeito à eliminação da modalidade da adopção restrita, prevendo-se, não obstante, a possibilidade de, excepcionalmente, poder ser estabelecida a manutenção de alguma forma de contacto pessoal entre o adoptado e algum elemento da família biológica, e até mesmo entre o adoptado e a respectiva família adoptiva e algum elemento da família biológica.

Muito embora contra o parecer do Conselho Superior do Ministério Público8, eliminou-se também o instituto da “confiança judicial”, passando o encaminhamento para a adopção a depender unicamente de decisão de confiança administrativa ou de medida aplicada no âmbito de um processo de promoção dos direitos e protecção da criança.

Sobressaem, de igual modo, as alterações introduzidas em matéria de consentimento prévio, que passa a ser irrevogável e deixa de estar sujeito a qualquer prazo de caducidade9. Realce-se, ainda, que, recebido o requerimento para prestação de consentimento, deverá ser imediatamente designada hora para prestação do mesmo por parte do tribunal, preferencialmente para o próprio dia10.

Outra das inovações desta reforma consiste na consagração do direito de acesso que assiste ao adoptado ao conhecimento das suas origens, nos termos e para os efeitos previstos no art. 6.º do RJPA. Privilégio que, porém, se julga ficar vedado às crianças adoptadas em momento anterior ao conhecimento da sua filiação biológica, já que, decretada a adopção, não será possível estabelecer a filiação natural do adoptado nem fazer prova dessa filiação fora do processo preliminar de casamento11.

Por último, destacamos o alargamento da excepção ao princípio de adopções simultâneas e sucessivas às situações previstas no artigo 1978.º do Código Civil, a certeza de que a sentença de adopção é susceptível de impugnação mediante a interposição de recurso extraordinário de revisão e, finalmente, que o tempo de vivência em união de facto anteriormente ao casamento releva para efeitos de contagem do prazo de 4 anos necessário para que duas pessoas casadas e com mais de 25 anos possam adoptar uma criança, mantendo-se os demais requisitos relativos à capacidade para adoptar.

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1 Cfr. art. 56.º, n.º 1 do RJPA
2 Prazo susceptível de prorrogação, por igual período, em casos excepcionais devidamente justificados (cfr. art. 37.º, n.º 2 do RJPA).
3 Cfr. arts. 15.º a 25.º do RJPA.
4 Prazo susceptível de prorrogação por um período máximo de 3 meses (cfr. art. 50.º, n.º 3 do RJPA).
5 Cfr. art. 1973.º, n.º 1 do Código Civil
6 Cfr. art. 60.º do RJPA.
7 Cfr. art. 42.º do RJPA.
8 Disponível in app.parlamento.pt.
9 Cfr. art. 1983.º, n.º 1 do Código Civil.
10 Cfr. art. 35.º do RJPA.
11 Cfr. art. 1987.º do Código Civil.